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De Friedman à responsabilidade social. O papel da empresa não é mais o mesmo
A perspectiva original de buscar apenas a maximização do lucro foi superada e a Responsabilidade Social empresarial assumiu novos formatos, com foco na sociedade e no meio ambiente
Até a década de 1950, responsabilidade social empresarial significava criar empregos, obter lucro e cumprir obrigações fiscais e legais.
Preponderava a visão de que o papel da empresa era apenas gerar lucro, pensamento defendido pelo economista Milton Friedman. Às empresas não cabia papel social junto à sociedade; delas não se deveria esperar outra coisa senão a maximização da riqueza, não podendo haver qualquer impedimento à liberdade de mercado que ultrapassasse os deveres estritamente legais.
Para Ana Frazão, em seu livro “Constituição, Empresa e Mercado” o pensamento de Friedman é incompatível com uma ordem econômica constitucional que, como é o caso da brasileira, tem por fim assegurar uma existência digna, de acordo com a justiça social. Daí porque as posturas radicalmente contrárias à responsabilidade social não encontram guarida no arcabouço normativo que a Constituição ofereceu para o exercício da atividade empresarial.
Ainda sobre a visão de Friedman, segundo Amartya Sem (“As pessoas em primeiro lugar: a ética do desenvolvimento e os problemas do mundo globalizado”), tal entendimento foi destronado pela realidade. Forças sociais cada vez mais amplas exigiram uma perspectiva menos estreita. Em economias cada vez mais concentradas, os impactos das decisões e ações das empresas líderes de mercado recaem sobre toda a sociedade. Em cidades e regiões inteiras, umas poucas empresas são determinantes na vida das pessoas que ali vivem.
A ideia do papel a ser desempenhado pela empresa foi se modificando rapidamente nos últimos anos. Com as mudanças sociais e econômicas, a perspectiva original de apenas objetivar a maximização de lucros foi superada e a Responsabilidade Social empresarial assumiu novos formatos, como — por exemplo e, principalmente — o foco na sociedade e no meio ambiente. A preocupação apenas com a empresa de modo isolado, isto é, servindo somente aos interesses dos sócios e acionistas, não mais se sustenta.
A mudança de paradigma no conceito da responsabilidade social empresarial se deu também, por conta do amadurecimento (forma de pensar mais consciente) da sociedade em relação à importância da ética do desenvolvimento no ambiente empresarial. Hoje, é necessário, e até mesmo obrigatório, que a empresa adote práticas sociais empresariais inovadoras e eficazes, comprometidas com a comunidade, com olhar voltado ao meio ambiente, aos consumidores, aos trabalhadores e à interação com os demais stakeholders. Ter responsabilidade social empresarial é incorporar ao negócio os interesses da sociedade.
O Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social define responsabilidade social empresarial como a forma de conduzir os negócios que torna a empresa parceira e corresponsável pelo desenvolvimento social.
Nessa linha, ao dispor sobre a responsabilidade social empresarial, Amartya Sen elenca o que se espera das empresas: 1. Políticas de pessoal que respeitem os direitos dos que fazem parte da empresa e favoreçam seu desenvolvimento; 2. Transparência e boa governança corporativa; 3. Jogo limpo com o consumidor; 4. Políticas ativas de proteção do meio ambiente; 5. Integração aos grandes temas que produzem bem-estar comum e; 6. Não praticar um código de ética duplo.
Necessário destacar que a responsabilidade social empresarial consiste numa prática espontânea por parte das empresas, não deve ser incorporada como estratégia de marketing, mas como política interna de adoção de medidas efetivas, em razão da preocupação genuína com os impactos de suas atividades no desenvolvimento da sociedade, assente no princípio da solidariedade constitucional, que serve de meio de realização da dignidade da pessoa humana, de modo a atender aos fins da justiça social.
Inclusive, uma das críticas feitas em relação à responsabilidade social empresarial, é exatamente esta, de que algumas iniciativas são implementadas mais pelo marketing do que pelo interesse na realização do projeto social.
A responsabilidade social empresarial não se confunde com filantropia. O objetivo é atuar de forma transformadora na sociedade e não trabalhar sobre a miséria da comunidade.
A voluntariedade é o que a diferencia a responsabilidade social da função social da empresa, princípio que legitima a imposição de deveres cogentes. Por se dar de forma espontânea e voluntária, a responsabilidade social empresarial também se diferencia da governança corporativa, pois esta se volta para questões mais corporativas do que sociais.
O Instituto Brasileiro de Governança Corporativa define como governança corporativa, o sistema pelo qual empresas e demais organizações são dirigidas, monitoradas e incentivadas, envolvendo os relacionamentos entre sócios, conselho de administração, diretoria, órgãos de fiscalização de controle e demais partes interessadas. Os princípios básicos da governança corporativa são transparência, equidade, prestação de contas e responsabilidade corporativa.
Uma boa governança pode ser fator determinante para a adoção e efetivação das práticas de responsabilidade social no ambiente empresarial, pois também cabe à governança corporativa se dedicar a criar políticas internas de práticas de responsabilidade social empresarial.
Como visto, as empresas vêm assumindo papéis de destaque perante a sociedade civil e devem verdadeiramente preocupar-se cada vez mais com o impacto da sua atividade, seja para reduzir as externalidades negativas de seus negócios, assim como aumentar as positivas e adotar iniciativas que resultem no desenvolvimento da sociedade como um todo.
A responsabilidade social empresarial tem compromisso com o bem-estar social, com a justiça social, com a sustentabilidade, com a cooperação e as parcerias, com o foco nas partes interessadas, com a promoção da ética nos negócios, com a inovação e a criatividade.
A responsabilidade social empresarial é uma abordagem adotada no mundo corporativo, que busca contribuir para o desenvolvimento sustentável da sociedade, assim como busca minimizar o impacto negativo da sua atividade junto ao meio ambiente, promover e apoiar projetos sociais de forma a beneficiar as comunidades onde a empresa atua. E aí, sua empresa possui responsabilidade social?
*Anne Wendler é advogada, sócia no Rücker Curi Advocacia e Consultora Jurídica